sábado, 19 de setembro de 2015

Monogamia

Essa parte aqui do peito doía mais, e eu não sei se era por conta da insuficiência cardíaca, mas tava cada vez mais difícil. O peito doía demais, o corpo todo doía também, mas nada se comparava aquela dor especifica. Aquela que dói mais quando respira, que mexe e dói, como uma fratura exposta de todas as vezes que meu coração tinha partido ao meio. 
Juntei suas coisas numa caixa pra te deixar no portão de casa. De qualquer forma, não conseguiria olhar pra sua cara novamente e não me lembrar de você, por cima, e nossos corpos suados. O calor daquela imensidão de um prazer ilusório. Você não passou em casa pra pegar seus restos, nem saiu de cima de mim... e tudo veio de volta para os espaços da minha comoda. Eu tinha ameaçado tantas vezes ir embora que já nem tinha mais credito. Era uma divida imensa comigo mesma que eu não sei se iria conseguir pagar tão breve, mas fiz lá mais algumas parcelas pra empurrar essa história com a barriga. Infelizmente, a conta chegou em casa com um juros meio alto, e eu tentei pagar o minimo que me exigia. 
Caramba, como era muito. As contas se amontoavam na gaveta, tanto quanto as suas coisas iam se proliferando pelo meu armário. Que mofo do inferno! Eu tinha deixado as janelas abertas pra tomar um pouco de sol e ar, já tinha jogado fora as roupas mais emboloradas - aquelas que não tinham jeito. Mais rápido que as contas atrasadas, nossas bactérias se proliferavam. Nossas roupas tinham o mesmo cheiro, nosso rosto o mesmo encaixe, nossa boca um sabor só. 
Fizemos despedidas rasgadas e rasgamos também as nossas contas. Um amigo me deu um armário novo, uma porção de novas coisas pra se desenhar, e eu me sentia com nada pra fazer. Até que no meio de toda aquela bagunça, eu achei aquela conta atrasada que esquecemos de pagar.
O juros foi alto, foi difícil, mas ela não existe mais.




Bruna Ferrari

terça-feira, 1 de setembro de 2015

Aquele Tsuru que Se Tornou Mil

Naquela semana eu já tinha perdido vários amigos. Por vezes, ignorado alguns. A minha paciência era zero e a preguiça social então, quase um numero negativo. Eu tinha esbarrado de ombro com alguns que fizeram história. Alguns rostos que agora eram só rostos, e isso, acreditem, não é uma coisa ruim. De certa forma até parece que me olham de canto do olho porque ainda se incomodam com minha presença por perto. Já eu, olho no olho porque não me incomodam mais.
Sempre mantenho olhares esquivos de coisas mal resolvidas. Sabe aquela famosa frase "se os olhos não veem, o coração não sente"? Então, funciona mais ou menos assim. Estive fora por meses e voltar naquele lugar me dava calafrios. Eu fiquei muito contente de perceber que na corrida de obstáculos dessa vida, já estava alguns quilômetros a frente e pulado varias barreiras. Acho que agora os meus livros parecem mais interessantes. Mal consigo dar a segunda chance que é de direito das pessoas, principalmente as que já começam com aquele discurso: "não é que eu esteja errado, é só a minha opinião...". 
O que teria mais de interessante no convívio social não-seletivo? Pois é, alguns estresses, outros quase-amigos. Eu sou bem dramática no geral, tudo isso é levado a mil e eu fico uma pilha de nervosos. Tenho medo de quebrar lixeiras por ai, ou acabar quebrando a cara de alguém pra relaxar. 
Exatamente neste momento que eu reparo nos olhos esquivos, e o esforço pra ignorar o que incomoda (que já não é mais meu, claro), volto naquele episodio dos meus dedos verdes por conta do papel. Naquela semana que eu fiz um tsuru e você, teoricamente, deveria ter aprendido. A parte mais legal é que o meu pedido se realizou. Aquele tsuru se tornou mil, apesar do numero de amigos despencado tristicamente.
Guardei tudo numa garrafa com um laço azul, a sua cor preferida. E essa garrafa deveria ficar exposta no meu quarto pro resto da minha vida. Eu me lembraria do motivo do primeiro tsuru, até o ultimo. Daquele dia em que você me salvou pela segunda vez. E das vezes que eu vou estar aqui pra quando você precisar também. 



Bruna Ferrari