domingo, 2 de agosto de 2015

Dentro de Casa

"Sem você, eu sumo
Eu morro de fome
Eu perco meu rumo
Eu fico menor"


Eu era toda sentimentos. Apesar daquele tempo todo que você já tinha deixado nossa casa, as suas coisas continuavam no lugar. Não procurei mexe-las, nem revirar a minha vida, nem encontrar algo novo. Nosso pedaço de relacionamento tinha sido conservado em bom formol pela mobilha do meu quarto. Alias, do nosso quarto - que em pouco tempo virou a casa toda e parte do meu armário. 
Algumas manhas eu acordava olhando o céu, os olhos inchados, a manga do pijama molhada. Algumas tardes eu passava em frente da TV, de baixo das cobertas com meus cachorros, comendo batata-frita. Algumas noites eu simplesmente não dormia, engolia meia duzias de remédio e repetia todo o ciclo. No dia em que você foi embora eu dei inicio a uma porção de coisas: aulas de Yoga pela internet, desenho, passeios aos sábados a noite, pornografia exagerada, contar meus dedos do pés. 
Não importa o quando eu me esforçasse, não dá pra correr contra a mare. Se foi difícil o dia em você saiu de casa, o dia em que você voltava pra me deixar de novo era mais ainda. Troque as fechaduras, você fez questão de esquecer as chaves em cima da escrivaninha. Mas a campainha tocava, e era você outra vez. Num gesto brusco eu abria a porta, depois logo fechava na sua cara pra abrir de novo e pular no seu colo.
Desnecessariamente, aquela era nossa casa, e nossa história estava gravada nas mobílias, nos cantos das paredes, no pano de chão. Por todo o lado tinha a gente, até mesmo nos meus cachorros. A partir daquele acontecimento, eu finalmente entendi os casais que gritavam um com o outro, mas sempre andavam juntos. É difícil escrever uma outra história em cima de uma folha rabiscada, reaproveitar uma folha já rascunhada com nanquim. Existia muito o que jogar fora dentro de nós. Se agora, eu era toda sentimentos, quando você estivesse por perto era mais. Mais que isso. Era uma casa toda. Uma história. Um pedaço da gente.

Bruna Ferrari